segunda-feira, 29 de outubro de 2018

UM DIA DEPOIS DA CHUVA

Uma canção ecoa no rádio
fala de uma nova chance
de um novo dia
uma canção ecoa na minha mente
tanto mais quanto poderia

o tempo se acinzentou
nuvens feias correm ao norte
preparam uma chuva daquelas
de mãos dadas esperemos
trancados em portas amarelas

do tanto que sonhamos
um teto se desmantela
crianças festejam na rua
a chegada adiantada do natal
a ferida lateja, a carne nua

no inverno tropical
o sol também brilha
aquece casacos
que jamais serão usados
enquanto aguardam surdos à espera

da redenção vindoura
uma aposentadoria
uma xícara de chá
a quitação do carro usado
sentados à calçada enquanto cai a tarde

Um poema numa folha amarelada
diz de um velho mundo
que se descortina
a tentar se re-fazer
dos escombros de outro que soçobra

sua leitura em voz alta
amansa o meu coração
aplaca o trêmulo da carne
regula a respiração
seca a lágrima que desce a face

Abraço o meu irmão!
não somos tão diferentes
brincamos na mesma rua
topamos as mesmas pedras
e sonhamos os mesmos sonhos

É tempo de paixões à flor da pele
é tempo de pele
é tempo de flor
não para vencer qualquer contenda
mas para aproximar contendores

tempo de calar todas as dores
existem crianças à nossa espera
e existe muita espera
retida nas retinas que envelhecem
à sombra do que dizemos

é tempo de ter esperança
é tempo de sentir a brisa de chuva
e sorrir, abrir riso largo
falar e escrever sobre amor
cantar e dançar na chuva

as nuvens pesadas escuras
eu vejo sua dissipação
aos olhos que pedem à margem
eu digo
a vida é feita de coragem!

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

ESTREITA FAIXA

No peito, em perigo
a faixa

Na estreita faixa
andamos

limiar de paixões
extremas

não se misturam
as cores

que não se separam
tais cores

mesmas cores
antagônicas

Tanta derrota
numa vitória

Nenhum sistema
de liquidação

terá solvência
convalescênça

após facada
no peito

no bucho
enrolada a faixa

em fezes
falácia fictícia

os extremos se apoiam
e se anulam

Nem a vinda segunda
de Yeats nos salvaria

selvageria esta,
está lançada

e sua arena além de real
é virtual

também viral
nata falida apodrecendo

do nosso lado
todos os lados

A faixa é mais uma gaze
suja de sangue

de quem o sangue?
qual sua cor?

sangue é vermelho
de toda cor

O que vier
de sua boca

de urna oca
já não importa

tudo rompido
é o resultado

mais aclamado
de nosso pleito.

quarta-feira, 10 de outubro de 2018

SACOLEJOS DE UMA CEGA VIDA

Me acuda
me sacuda
como culpe
me desculpe

Não vejo todas as coisas
e das que vejo, muito do tempo embaça
a vista cansada compreende o mundo
de um modo equivocado
avesso à vezes
enviesado

por mal não faço tais coisas
é mais uma visão diversa
não veja culpa, veja a seu modo
que também é grande jeito de ver
por outro lado
diferençado

Me desculpe
me sacuda
como culpe
me acuda

Maldade não entenda
em atos meus desavisados
entenda talvez displicência
sem tê-la então por essência
dos feitos humanos
atravessados

muito temos na vida
em busca de acerto
caminho estreito trilhado
tropeços e outros mal feitos
saem por concerto
errados

Me sacuda
me desculpe
me acuda
como culpe

mesmo atados passos
em tropeços temos chegado
não por objetivo
não por certo destino
apenas que são caminho
nessa distante jornada
que cegos temos trilhado

mas sigamos
mãos firmes e dadas
a linha de norte é de fronte
se corta rente ao horizonte
desse incógnito mapa traçado
que pro entre idas e vindas
nosso existir é marcado

Como culpe
me acuda
me desculpe
me sacuda.